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sábado, 27 de fevereiro de 2010

POLÍTICA | Perdidos

ANELITO DE OLIVEIRA - Devo atribuir o longo silêncio ao grau de intranquilidade que este ano naturalmente exala pelo país afora. A política não deveria ocupar o lugar que ocupa na vida de cada um de nós, como gostaríamos que não!, mas ocupa, e tudo tende a ficar mais brutal se insistimos em achar que não. No momento, encontramo-nos entre o pior, o mais pior e o pior ainda etc etc, uma situação que é, sobretudo, o escancaramento da política como destruição da política - palmas para Lula e seu PT alianceiro.
O que Dilma, Serra, Marina e Ciro - principais atores em cena - representam de autêntico, de diferente, de si-mesmo, em relação a Lula? Efetivamente, nada. Ninguém ostenta um projeto novo para o país, como se não houvesse mais possibilidade de novidade em termos societários por aqui, como se a história tivesse chegado ao fim com a ascensão petista ao poder federal.
O que Marina e Ciro, com seu desejo ardente de dizer alguma coisa comovente, dizem é o que, nos limites da situação, o Governo Lula tanto já disse. Ciro, com seu ânimo nordestino, acaba até por acrescentar algo em termos de repolitização da discussão, mas Marina, com sua toada climática, apenas alimenta um perigoso desvio das contradições sócio-históricas que demandam a ação política.
E estamos apenas no início de um ano com eleições para cargos executivos e legislativos, federais e estaduais. Sem dúvida, já vimos quase tudo em termos federais e alguma surpresa, se houver, surgirá em termos estaduais. E aí Lula entra novamente no jogo, como um fantasma onipresente - bom, para seus aliados, fãs, fiéis etc, mas péssimo para a política em si.
Lula entende que o importante é o PT preservar o comando do Governo Federal, garantindo a vitória de Dilma Roussef, deixando os Estados em segundo plano, nas mãos de aliados como PMDB, por exemplo. Falando bem a língua do presidente: os Estados devem funcionar como bucha de canhão para o PT ganhar a guerra.
Há nisso, antes de mais nada, um reflexo de concepção autoritária de poder que o PT, assim como os demais partidos no Brasil, trazem de nascença. Nessa concepção, para lembrar Hannah Arendt, o mandatário ocupa o topo da pirâmide, donde comanda seus subordinados, distribuídos entre os demais níveis.
Lula está pensando, então, na manutenção de Brasília, do topo da pirâmide federativa, e assim dá o golpe decisivo na cultura política de base que o próprio PT fomentou ao longo dos anos 80. Claro, já naquela década, o sonho - que Dilma e os assessores de Lula mais prestigiados não sonharam juntos com os então xiitas - era chegar ao topo da pirâmide, mas não para fazer o mesmo que todos que estiveram lá sempre fizeram: usar o interior do país, o Brasil profundo, apenas como massa de manobra para a conquista e manutenção de um poder paradoxalmente impotente: o que o PT fez ou faz nestes oito anos de impossível na nova ordem social mundial? Nada, absolutamente nada.
Claro que uma retomada da cultura política de base neste momento seria um gesto até dignificante para o partido, um raro presente de aniversário de 30 anos. Mas não. O PT, que em Minas Gerais tem um Patrus Ananias, com tantos quadros em SP e Rio, prefere concordar com o presidente pretensioso e provinciano em que Lula se converteu, o homem que reduz a complexidade inerente à política à banalidade do futebol, que só se interessa por gols, gols, gols: ninguém mexe em time que tá ganhando.
Estamos perdidos, para não dizer outra coisa.