Páginas

segunda-feira, 11 de abril de 2011

ARTIGO | Sobre a tragédia no Rio

ANELITO DE OLIVEIRA - Parece que não temos saída dentro do mundo para dimensões paradisíacas, por mais que as busquemos. Parece que estamos fadados a vivenciar infernos de vária ordem, que se apresentam por toda parte, com ou sem motivo. Como não falar disso, por um lado, e como falar apenas disso, por outro? Creio que é preciso despertar outros horizontes, sempre, mas não fingir que a realidade nua e crua não existe, e com sua razão de ser, com seus fundamentos peculiares em cada lugar, a cada momento. Em relação à tragédia no Rio, é preciso considerar duas coisas, no mínimo: a vulnerabilidade das escolas públicas brasileiras de todos os níveis e a condição de vítima do assassino, vítima da espetacularização da violência praticada pela cinematografia vulgar dos EUA, pelas TVs brasileiras, especialmente a Globo, pela submúsica de rappers norte-americanos e brasileiros, por certa subliteratura policialesca brasileira e estrangeira, também, por fundamentalistas de várias seitas e religiões. A atitude terrorista de Wellington Menezes constitui a reprodução da violência por aquele que foi violentado simbolica e realmente. De um ponto de vista lógico, entendemos que nada justifica qualquer tipo de crime, que todo crime é injustificável, mas é claro que a mente de um criminoso - a partir do momento em que o sujeito decide cometer um crime - não funciona mais a partir de preceitos lógicos, claro que trata-se de uma mente que assumiu o ilógico como sua lógica. Não há outra esfera senão a social para se entender quaisquer ações criminosas, por mais que nos pareçam coisas de outro mundo, uma vez que foi na sociedade que essas ações se configuraram. Sujeito de uma sociedade belicosa, que se recusa - em plebiscito - a abrir mão de suas armas, Menezes não é, como a mídia vem alardeando, o único, o principal, autor de uma tragédia sangrenta, que marcará definitivamente a vida de tantas pessoas, especialmente a dos pais das crianças. Na verdade, ele é co-autor, ao lado de políticos corruptos, empresários e celebridades irresponsáveis que deixam as escolas públicas relegadas às traças, que não se preocupam efetivamente com a erradicação da cultura da guerra e estabelecimento de uma cultura da paz no país, que não se preocupam com a garantia de caminhos mais inteligentes, mais produtivos, para a juventude. Não nos enganemos: Menezes é produto da "banalidade do mal" (Arendt) no Brasil do século XXI, de conteúdos maléficos ofertados pelas TVs e pela Internet, que toma conta do país cada vez mais, enquanto a educação pública, único alicerce para uma vida social justa, não para de agonizar, o que faz de qualquer escola pública um alvo potencial de toda uma geração de degenerados.

terça-feira, 5 de abril de 2011

ARTIGO | Assim seja

ANELITO DE OLIVEIRA - Não abandonei este espaço, embora possa parecer - são dois meses desde a última postagem. Estou novamente aqui e gostaria, antes de mais nada, de agradecer àqueles (as) que têm me seguido e àqueles (as) que me leem volta e meia. Creio que já possa retomar as escritas depois de uma longa reflexão sobre o sentido de manter um blog. Não é a primeira vez que me vejo incerto sobre esse sentido, numa situação crítica. Novamente, concluo que o sentido passa pelo cerco à expressão que os próprios meios de comunicação tradicionais - rádios, tvs, jornais, revistas e editoras - impõem há vários anos no Brasil a todos (as) que são o que são. A transformação do "Mais!" em "Ilustríssima", na Folha de S. Paulo, é exemplo disso. No lugar de debates, futilidades. O esvaziamento do "Suplemento Literário de Minas Gerais" é exemplo disso. No lugar de literatura, camaradagens. Não há espaço nos meios de comunicação estabelecidos para dissonâncias, só para louvações. É uma situação que, no âmbito da literatura, vai tomando conta cada vez mais da internet, com as revistas online reunindo grupos de amigos, uns elogiando os outros, numa eterna repetição do Modernismo de 22. Sem dúvida, o cerco, melhor, o fechamento do cerco, à livre expressão é um dos traços mais eloquentes da inexistência de democracia real no país. Certamente, nunca existiu, talvez porque a democracia seja algo de índio, de negro, de mulher, de doente - de um lado considerado incongruente com uma ideia safada de Brasil. Nada melhor para ilustrar essa ideia safada de Brasil que o Big Brother de Pedro Bial. Sim, precisamente, mesmo que inconscientemente, meu silêncio nestes dois meses tem a ver com isso: o país é este - se alguém ainda tem dúvida -, aquele bando de vagabundos rindo da nossa cara no BBB e tratados como heróis, e como escrever em face deste país? Mas claro, a literatura é um escrever contra, sempre, contra tudo que nos humilha, que nos enoja, que nos entristece, que nos desmerece. O que dizemos na literatura, com a literatura, não é mesmo possível, nem será possível, dizer em outro lugar. O blog pode ser, deve ser, um espaço de resistência ao que está aí nos oprimindo a cada dia. E aqui estarei, a partir de agora, sem rosto, sem biografia, sem curriculum (a biografia de um escritor são suas palavras e silêncios desde sempre), uma voz no anonimato, uma nova identidade, a outra. Assim seja, aqui neste território impossível (a literatura) no velho mundo das possibilidades rentáveis.