Dentro da onda
Para Waly Salomão
Riamos,
ríamos muito, ríamos
Completamente,
e era difícil saber
De
que estávamos rindo ali em
Meio
à tarde, num espaço sóbrio,
Ríamos,
você lá no Rio, eu em BH,
Você,
colaborador ilustre, eu editor
De
um suplemento literário, ríamos,
Claro,
da nossa condição ridícula
No
mundo, tentando ser, saber
Alguma
coisa, condição que se ia
Revelando
ali a cada lance retórico,
Você
se dizendo tabaréu do sertão
Baiano
e me dizendo jagunço do
Sertão
rosiano, cheio de negaças,
Como
é? Negaça, é, máscara, você
Parece
um jagunço! Quem? Eu?!
E
ríamos, ríamos da vida como ela é
Enquanto
você atirava postas de vidas
Estrangeiras
aos meus ouvidos como
Um
bricoleur deslumbrado no lixão
-
Ele, ele, ééé, Ele com E maiúsculo,
Uma
entidade de que não pronuncio
O
nome – quem? Hélio Oiticica? Sim,
-
Não me arrisco nem a dizer o nome
Dele
tal é o meu respeito, Ele, sim!
E
Cássia Eller no Dona Lucinha nas
Noites
de show, coisas a perceber
Risonhamente
no mundo, Caetano –
Este,
sim, esperto como uma Cobra
Coral
-, O Rappa cantando Vapor
Barato,
Afroreggae reinventando o
O
som do morro, o mangue de Otto,
E
coisas também a desperceber – uma
Bahia
e tantos baianos na margem
De
uma onda reacionária – sim, e ele
Repetia
à exaustão como quem fazia,
Suando,
vatapá ou agitava candomblé
-
sim, sim, sim, por isso vim embora
Um
dia, “Memória da pele” é isso,
“Eu
já me esqueci você”, é a Cidade
De
Salvador, eu deixando a Bahia,
Nada
desse negócio de ficar à margem
Da
onda, assistindo de longe, eu
Quero
ficar é dentro da onda, dentro
Da
onda, dentro da onda! –, e era de
Lá,
eu pensava, que vinha sua voz,
De
dentro de uma onda convulsa onde
Você
morava profundamente, que lhe
Era
íntima e de quem você era íntimo,
Sua
homérica onda árabe que não se
Apaziguava
– Que paz o quê? – Você
Gritando
a plenos pulmões na noite
Sertaneja
– o que existe é guerra, é
Guerra!
– E todos amedrontados, a
Temer
que você os violentasse, todos
Assombrados
com a sua loucura, cada
Um
procurando seu canto, enquanto
Você
gritava ao telefone cobrando o
Pagamento
pela sua performance e
Se
rebelando contra o cinismo estatal
Que
assassina a poesia – Poetas pela paz?
Que
paz o quê? É guerra, guerra! – e,
Tapando
o som do telefone de mesa,
Olhava
para mim – que estava ali pelo
Prazer
de reencontrá-lo - e ria, ria, ria,
E
ríamos daquilo que sabíamos ser
Apenas
mais um ato da peça barroca
Que
você encenou durante toda a vida,
A
graça, por que ríamos, não sabiam,
Era
a presença de Waly no mundo
05
de maio de 2013
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