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quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

JORNALISMO | Editorial

ANELITO DE OLIVEIRA - Pra quê este blog?
Pra falar de coisas pessoais, como tantos?
Um diário aberto ao público?
Para exibir proezas de uma vida supostamente rara?
Não. Claro que não.
Este blog atende a uma finalidade mais profissional, digamos. Pretende ser, como alguns, um espaço para publicação de textos que podem interessar a algumas pessoas próximas e distantes, nas Duas Barras e no Butão. Poucas, sem dúvida.
Pretende, também, ser um espaço para dialogar com essas pessoas em dias terríveis, como são estes em que estamos vivendo desde a década passada.
Terríveis? Por que terríveis?
Terríveis porque estamos emparedados no mundo livre s/a. Com aquele sentimento que Cruz e Sousa (1861/1898) soube apreender como ninguém na cultura brasileira e expressar no seu “O emparedado” (Evocações, 1898; In: Obra completa, Aguilar, 1995).
As paredes sousianas, como tentei mostrar numa tese de doutoramento na USP (O clamor da letra: elementos de ontologia, mística e alteridade na obra de Cruz e Sousa, 2006), eram, claro, discursivas.
O discurso extravasa os limites da pessoalidade. Todo discurso implica o todo, arrasta o que lhe circunda. Não só espacialmente, mas também, num dado “horizonte de expectativa” (Jauss), temporalmente.
Aquelas paredes, o emparedamento de um sujeito, não circunscrevem, portanto, apenas uma realidade brasileira de fins de século XIX, não têm a data de um dado contexto.
Itamar Assumpção, no seu impagável “Preto Brás” (Atração, 1998), em pleno final dos anos 90, que o diga, e disse:
“sou cruz e sousa, zumbi, paulo leminski,
(ave Maria)
mas samba is another bag”
E disse depois de dizer, na abertura dessa obra prima (de Cruz) que
“porcaria na cultura
tanto bate até que fura”
Dias terríveis.
Cada um no seu canto, no seu portal, no seu site, no seu email, no seu blog... (este não é mais um blog, nada de pessoal, legal, au, au etc).
A solidão nunca esteve tão na moda, e de modo tão perverso, nada romântico: solidão pela solidão.
Há uma razão de ser, naturalmente, nessa solidão. Mas, como toda razão de ser, precisa ser colocada em xeque, precisa ser levada ao limite de si mesma, atingir a razão de ser mais, quem sabe sua desrazão.
A razão de ser: não há nada lá fora. Não me deixam falar. Só falam sobre futebol. Só escutam o pagode “segregamulher” (tomzé), o sertanojo. Só tomam sol.
A razão de ser mais: o outro humano começa no humano outro. Diria Lévinas, évidemment, acrescentando que é fundamental o encontro.
Encontrar, encantar-se.
Encontramento, encantamento.
Este blog não visa o lado de dentro sem fora.
Visa o lado de fora lá dentro, no meio da rua.
O que não se pode fazer em jornal, rádio, televisão. A liberdade de fazer de um modo outro, num outro formato, como um outro. Liberdade maior de voltar a ser outro, de encontrar o perdido outro de si mesmo, em si mesmo.
No lulismo enganador da nossa desilusão, no socioautoritarismo democrático, não há liberdade de expressão nem na Montes Claros de Darcy Ribeiro nem na São Paulo de Mário de Andrade, muito menos no Rio de Cartola e no Reciferido de Jommard Muniz de Brito e Frederico Barbosa.
Este blog é pra sair de si.
Entrar em si. Também.
This is Hegel.


2 comentários:

  1. E aí Anelito, quando faremos a vernisage do meu novo trabalho?...abraços... Lembranças a Fátima e aos meninos...Valdeir do Rosario

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  2. Anelito: esse post foi o melhor que li até agora. Lembro um pouco Gilberto Vasconcellos.

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